FURTO
dentro do ônibus (D 43 Universitária)
As pessoas que me conhecem já sabem que quase nada me
afeta. Digo quase nada, pois não dou importância para muitas “coisas” que a
maioria dos mortais julga essenciais em suas vidas. Não ligo para sua cor, sua
religião, seu cabelo, seu jeito de vestir ou de falar. Eu ligo, sim, para você!
Para suas atitudes e seus valores. Talvez por isso me decepcione tanto em
algumas situações cotidianas que, por estarem banalizadas, já não agridem mais
a muitos.
Hoje, ao retornar para casa ao meio-dia, dentro do ônibus
D 43, Universitária, no sentido Ipiranga – Centro, lotado ao extremo, alguém FURTOU
minha carteira. Quando o ônibus parou na
estação rodoviária, muitas pessoas desceram e eu encontrei um lugar para me
sentar. Ao sentar, percebi que minha bolsa estava aberta. A “criatura” abriu
uma parte da bolsa e “tirou” minha carteira.
Minha reação imediata? O desespero. Não pelo dinheiro,
nunca tenho mesmo, mas por meus cartões, afinal, faço tudo com os limites, os
empréstimos, etc. Comecei a chorar e liguei para minha filha. Sim, a “criatura”
não levou meu celular, barato e vagabundo por sinal, pois estava no bolso da
frente da minha calça... Aos prantos, fui contando o que aconteceu. Uma gentil
senhora, ao ouvir a conversa, me doou cinco reais para que eu pegasse o outro
ônibus.
Desci no final da linha e procurei um representante da
Brigada Militar. Encontrei um perto do Mercado Público, que conversava
alegremente com uma moça de batom vermelho, que me explicou onde ficava a
delegacia mais próxima. Na Riachuelo, disse ele, a mais ou menos uma quatro
quadras. Subi a Borges de Medeiros, dobrei à D na Riachuelo e perguntei num bar
onde ficava a delegacia. O rapaz disse: _Aqui é o número 1.200 (mais ou menos,
não lembro direito) e a delegacia é lá para baixo, pelo número 600. Segui. O
telefone toca e minha filha, desesperada do outro lado, tenta acalmar meu
pranto. Entro numa ferragem e uma senhora de má um copo com água gelada.
Enquanto me acalmo, vamos conversando. Caminho mais um pouco.
Encontro a
delegacia. Na esquina, num prédio velho
e mal conservado, entro pela porta lateral. Uma escada (suja), uma sala (velha)
e ninguém na recepção. Parecia estar abandonada. Bato no balcão de madeira (velho), aparece um
senhor. Mal abre a boca, pouco pergunta. Não parece interessado na minha dor.
Pede meu nome, preenche um boletim de ocorrência (B.O.). Não pergunta sobre
detalhes. Escreve e pronto. Enquanto tento me lembrar o que tinha na carteira,
observo o ambiente. Tudo é velho!!! Prédio, mesas, cadeiras e objetos.
Nas paredes, em
murais feios e velhos, MUITOS AVISOS com o mesmo texto: BANHEIROS SEM CONDIÇÕES
DE USO POR TEMPO INDETERMINADO.
Neste instante, não sei se me apavoro por ter sido
roubada, pelo atendimento sem nenhuma reação do profissional do balcão (feito
de tábuas por alguém que, com certeza, não era marceneiro), pela distância da
delegacia do centro da capital do Rio Grande do Sul, ou pelo fato de não poder,
sequer, pedir para fazer xixi. E, mesmo
não querendo, as lágrimas escorrem...
Como é difícil viver em sociedade.
Fui roubada, atendida com indiferença, posso fazer xixi
nas calças e ninguém dá a mínima. Na multidão, você pode chorar, berrar,
implorar ou, até fazer suas necessidades fisiologias na roupa, dentro da
delegacia de polícia.
Agora, sentada ao computador, penso como andei por
aquelas ruas e consegui voltar para casa em tal estado emocional. Viver em Porto Alegre, isso sim é para os
fortes!
Calma, a COPA DO MUNDO vem aí. Vamos oferecer para as
pessoas que virão de todos os cantos do mundo ônibus lotados, assaltos grátis, atendimento
sem cortesia e delegacias abandonadas. E sorrir, como políticos imbecis, recém
eleitos, fazendo de conta que está tudo bem.
A propósito: Usei tantas vezes a palavra “velho” ou
“velha” porque foi realmente isso que me pareceu. Senti-me como devem se sentir
os velhos de Porto Alegre: roubados, abandonados, entristecidos e sem nenhuma
esperança.
ELEANA M. ROLOFF – Porto
Alegre/RS, 11/10/2012.